domingo, 28 de fevereiro de 2010

Romance ingénue de duas linhas paralelas

Duas linhas paralelas
muito paralelamente
iam passando entre estrelas
fazendo o que estava escrito:
caminhando eternamente
de infinito a infinito.

Seguiam-se passo a passo
exactas e sempre a par
pois só num ponto do espaço
que ninguém sabe onde é
se podiam encontrar
falar e tomar café.

Mas farta de andar sozinha
uma delas certo dia
voltou-se para a outra linha
sorriu-lhe e disse-lhe assim:
“Deixa lá a geometria
e anda aqui para o pé de mim…”

Diz-lhe a outra: “Nem pensar!
Mas que falta de respeito!
Se quisermos lá chegar
temos de ir devagarinho
andando sempre a direito
cada qual no seu caminho!”

Não se dando por achada
fica na sua a primeira
e sorrindo amalandrada
pela calada, sem um grito
deita a mãozinha matreira
puxa para si o infinito.

E com ele ali à frente
as duas a murmurar
olharam-se docemente
e sem fazerem perguntas
puseram-se a namorar
seguiram as duas juntas.

Assim nestas poucas linhas
fica uma história banal
com linhas e entrelinhas
e uma moral convergente:
o infinito afinal
fica aqui ao pé da gente!

José Fanha, in Eu Sou Português Aqui

domingo, 14 de fevereiro de 2010

...


"Nunca me pesou o que de trágico se passasse na China. É decoração longínqua, ainda que a sangue e peste."

Fernando Pessoa, in O Livro do Desassossego